segunda-feira, 22 de julho de 2013

Texto de Leonardo Santos Garcia sobre a exposição Dominus Tecum, de Evandro Prado, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS de abril a junho de 2013

Instalação de Evandro Prado, no Museu de Arte Contemporânea de MS

A arte contemporânea como atual fase artística em pleno desenvolvimento encontra algumas barreiras notáveis que impedem uma compreensão e até mesmo uma aceitação por grande parte da sociedade. Identificada pelo seu panorama de múltiplas expressões com esculturas, pinturas, vídeos, objetos de arte e o carro chefe: as instalações que as visualizo como uma arte efêmera em que se pode construir e desfazer simplesmente. Particularmente, sou enamorado por instalações. São vivas, gritantes, perturbam e encantam.
 
Em sua exposição Dominus Tecum, Evandro Prado encara e aproveita toda a perspicácia da arte contemporânea e junto dela integra uma “aliada” poderosa: a religião. Em um atual momento histórico, nada menos oportuno, a renúncia do líder da Igreja Católica traz a esse artista sua poética de trabalho para as obras.
Sobre minha análise, tenho uma visão geral da disposição das obras na sala, que a meu ver significa que a exposição segue uma linearidade. Insinuações acontecem ao longo do corredor que nos leva ao grand finale na sala seguinte. Vamos parte a parte.
A primeira obra Dominus Tecum (em tradução O Senhor seja convosco, por sinal um nome muito sugestivo), um lampadário feito com justaposição de imagens de santos está de cabeça para baixo e com um pequeno grande detalhe: o líder que está no “topo” não tem cabeça. Isso logo me incita que algo de errado aconteceu. Está fora da doutrina. Esse objeto deixou-me intrigado e curioso para o que viria em seguida.
Missões então aparece, o vídeo feito de dois fragmentos que foram somados de maneira que a passagem sempre fosse a mesma e repetitiva (e que tem um significado pra isso), mostra uma escultura, que para mim é de um anjo, segurando um lençol que seria a representação do Santo Sudário de Cristo com um coração bordado. O significado dessa obra é claro, a Missão da Igreja e de seu líder é disseminar o evangelho, pregar, repetitivamente mesmo com toda a conturbação retratada na peça anterior. A repetição apresentada no vídeo é conturbadora, angustiante.
Ruína. O nome dessa obra antecipa a representação da instalação subsequente. Uma grande imagem de um altar de uma igreja vazia. Em frente ao altar um corpo. O Cristo. Abandonado. Nú. Uma imagem irônica, triste. A igreja foi abandonada pelo seu líder, ele a deixou e não cumpre mais a Missão. Um retrato escuro, frio, silencioso, pesado, meio fúnebre.
El Grand Finale. Prado chega à conclusão de sua obra utilizando a chave mestra da arte contemporânea: a instalação. Constuindo Paraísos, uma grande cruz latina desenhada com tijolinhos, o chão da sala é coberto com os tijolos formando um desenho negativo da nave central de uma igreja. O objetivo é demonstrar uma não-construção, mas a minha leitura é de uma destruição do paraíso mesmo. Todas as nuances apresentadas nas obras anteriores nos leva as ruínas da igreja. A sensação de andar sobre os tijolos e ouvir o farfalhar do atrito entre eles é arrepiador, caminho sobre uma grande ruína. E como trunfo, não menos importante, Sede Vacante (em tradução Sé Vazia) uma escultura de Joseph Ratzinger em gesso toda branca. A cabeça que faltava do ser no topo do lampadário emerge da parede negra esboçando uma face com ares debochados, um sorriso contido irônico. O busto olha a desconstrução de sua igreja e ele em posição de troféu de caça não parece demonstrar reação insatisfatória com seu feito que provocou toda a desgraça.
Evandro Prado utilizou com maestria os elementos e fatos históricos para sua proposta de arte. Fez com que o espectador entrasse na obra, caminhasse sobre a arte. Expôs a fragilidade humana e a infalibilidade de um líder religioso visto como santo pelos fiéis seguidores da Santa Igreja Católica. Desconstruiu uma doutrina e nos propôs um novo paradigma, um novo olhar. Por fim, Dominus Tecum, Amen.
Leonardo Santos Garcia é acadêmico do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.

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