Instalação de Evandro Prado, no Museu de Arte Contemporânea de MS
A arte contemporânea
como atual fase artística em pleno desenvolvimento encontra algumas barreiras
notáveis que impedem uma compreensão e até mesmo uma aceitação por grande parte
da sociedade. Identificada pelo seu panorama de múltiplas expressões com
esculturas, pinturas, vídeos, objetos de arte e o carro chefe: as instalações
que as visualizo como uma arte efêmera em que se pode construir e desfazer
simplesmente. Particularmente, sou enamorado por instalações. São vivas,
gritantes, perturbam e encantam.
Em sua exposição Dominus Tecum, Evandro Prado encara e
aproveita toda a perspicácia da arte contemporânea e junto dela integra uma “aliada”
poderosa: a religião. Em um atual momento histórico, nada menos oportuno, a
renúncia do líder da Igreja Católica traz a esse artista sua poética de
trabalho para as obras.
Sobre minha análise,
tenho uma visão geral da disposição das obras na sala, que a meu ver significa
que a exposição segue uma linearidade. Insinuações acontecem ao longo do
corredor que nos leva ao grand finale na
sala seguinte. Vamos parte a parte.
A primeira obra Dominus Tecum (em tradução O Senhor seja
convosco, por sinal um nome muito sugestivo), um lampadário feito com
justaposição de imagens de santos está de cabeça para baixo e com um pequeno
grande detalhe: o líder que está no “topo” não tem cabeça. Isso logo me incita
que algo de errado aconteceu. Está fora da doutrina. Esse objeto deixou-me
intrigado e curioso para o que viria em seguida.
Missões
então
aparece, o vídeo feito de dois fragmentos que foram somados de maneira que a
passagem sempre fosse a mesma e repetitiva (e que tem um significado pra isso),
mostra uma escultura, que para mim é de um anjo, segurando um lençol que seria
a representação do Santo Sudário de Cristo com um coração bordado. O
significado dessa obra é claro, a Missão da
Igreja e de seu líder é disseminar o evangelho, pregar, repetitivamente mesmo
com toda a conturbação retratada na peça anterior. A repetição apresentada no
vídeo é conturbadora, angustiante.
Ruína.
O nome dessa obra antecipa a representação da instalação subsequente. Uma
grande imagem de um altar de uma igreja vazia. Em frente ao altar um corpo. O
Cristo. Abandonado. Nú. Uma imagem irônica, triste. A igreja foi abandonada
pelo seu líder, ele a deixou e não cumpre mais a Missão. Um retrato escuro, frio, silencioso, pesado, meio fúnebre.
El Grand Finale. Prado chega à
conclusão de sua obra utilizando a chave mestra da arte contemporânea: a
instalação. Constuindo Paraísos, uma
grande cruz latina desenhada com tijolinhos, o chão da sala é coberto com os
tijolos formando um desenho negativo da nave central de uma igreja. O objetivo
é demonstrar uma não-construção, mas a minha leitura é de uma destruição do
paraíso mesmo. Todas as nuances apresentadas nas obras anteriores nos leva as
ruínas da igreja. A sensação de andar sobre os tijolos e ouvir o farfalhar do
atrito entre eles é arrepiador, caminho sobre uma grande ruína. E como trunfo,
não menos importante, Sede Vacante (em
tradução Sé Vazia) uma escultura de Joseph Ratzinger em gesso toda branca. A
cabeça que faltava do ser no topo do lampadário emerge da parede negra
esboçando uma face com ares debochados, um sorriso contido irônico. O busto
olha a desconstrução de sua igreja e ele em posição de troféu de caça não
parece demonstrar reação insatisfatória com seu feito que provocou toda a desgraça.
Evandro Prado utilizou
com maestria os elementos e fatos históricos para sua proposta de arte. Fez com
que o espectador entrasse na obra, caminhasse sobre a arte. Expôs a fragilidade
humana e a infalibilidade de um líder religioso visto como santo pelos fiéis
seguidores da Santa Igreja Católica. Desconstruiu uma doutrina e nos propôs um
novo paradigma, um novo olhar. Por fim, Dominus
Tecum, Amen.
Leonardo
Santos Garcia é acadêmico do curso de Artes Visuais da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da
disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael
Maldonado.
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