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Lídia Baís, sem título/data, óleo sobre tela |
Lançar um olhar investigador no acervo do Museu de Arte Contemporânea de MS (MARCO) revela ao exercício curatorial possibilidades no reposicionamento do sentido de algumas obras, tornando dinâmica a relação entre o discurso e formas de interpretação de conteúdos e códigos que cada objeto artístico condensa nos limites de seu suporte.
Esse recorte curatorial investiga nessas obras as maneiras em que a representação do corpo, visível ou não, se evidencia nas condições oferecidas pela singularidade das linguagens de expressão. Nesse sentido, o que é percebido enquanto forma corporal se apresenta numa figuração que transita entre a idéia naturalista de anatomia e os desdobramentos a partir dela. O que se oferece ao espectador são contrapontos entre nitidez e apagamento, forma e decomposição, fragmento e totalidade, memória e esquecimento, permanência e transitoriedade.
Partindo da percepção de que o corpo sempre esteve presente na construção representativa da história da arte, essas investigações tornam evidentes as conexões dialógicas entre obras posicionadas numa condição temporal/geográfica que as separam, mas, que em certa medida, são aproximadas por uma determinada identidade temática.
Assim, os artistas reunidos nessa mostra operam com a idéia de corpo e realidade transcendente, ora se apoiando no desenho que conduz a construção da imagem figurada, ora mediando essa presença através de metáforas e insinuações capazes de deslocar o olhar mais estático, movendo-o em novas direções.
O figurativo estruturado pelo estudo anatômico se evidencia nas obras de Lídia Baís, Fábio Baroli, Cláudia Vilela e Nelson Vaz, onde a forma de representação se apóia nos processos acadêmicos de construção da imagem e do realismo necessário para potencializar as proporções do instrumento corporal.
Em Marcelo Solá, Carlos Nunes, Genésio Fernandes, Lú Sant’Anna, Beto Lima e Ciríaco Lopes, encontramos a presença do banal no cotidiano e da ironia sagaz que menciona a diversidade dos assuntos que formam nosso repertório social. O despojamento na maneira de ilustrar esses assuntos é o que torna as obras significantes do lúdico, da fantasia e da sátira, respondendo diretamente ao ciclo compulsivo do mundo contemporâneo.
A memória de algo e a condição do desaparecimento são assuntos perceptíveis nas obras de Divino Sobral, Ana Ruas, Marina Boaventura, Vânia Pereira, Miska e Irani Brun Bucker. As lembranças são de certa forma, maneiras de se perceber a passagem do tempo e a duração do sentido das coisas na formação de identidades. Os trabalhos trazem em sua confecção elementos de uma história que são transpostos para o suporte da obra e reforçam aquilo que não queremos e não podemos esquecer.
Helder Rocha, Edson Castro, Alex Maciel, Vitória Basaia e Ovini Rosmarinus operam com o gesto distorcido da imagem, deixando evidente a vertigem na maneira como interpretamos esse corpo que estica, se entrelaça, se fragmenta e quase perde sua definição: abstrai-se. O estranhamento presente manifesta a transgressão que considera um novo sentido poético da forma e outras leituras sobre a configuração de um corpo híbrido.
O corpo se transforma num território de negociação estética e encontra ressonância na constante inquietação do processo criativo. O artista nos propõe transposições de lugares e nos solicita, para isso, um passo adiante no deslocamento necessário para que possamos perceber melhor o espaço que ocupamos e como, pelo viés da arte, nos damos conta disso.
Rafael Maldonado
Curadoria
Março de 2011
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